segunda-feira, 29 de agosto de 2011

RESÍDUOS SÓLIDOS: UMA QUESTÃO BASTANTE ATUAL

Ione de Sousa e Silva
Licenciada em Geografia pela UEMA\CESI

Prof. MSc. Luiz Jorge Dias

Geógrafo - Mestre em Sustentabilidade de Ecossistemas

Segundo o relatório da ONU de 1999, qualidade de vida é o conjunto de percepções individuais da posição de vida das pessoas no contexto dos sistemas culturais e de valores em que se vive em relação as metas, expectativas, padrões e conceitos, Incorpora saúde física, o estado psicológico, o nível de dependência, as aspirações pessoais e relações sociais, as crenças pessoais e o seu relacionamento com o meio ambiente.

Essa qualidade de vida esta ligada a um fator muito importante que é o lixo. Com a grande concentração demográfica nas grandes cidades e o grande aumento do consumo de bens geram uma enorme quantidade de resíduos de todo tipo, procedentes tanto das residências como das atividades públicas e comerciais, por exemplo. Todos esses materiais recebem a denominação de lixo, e sua eliminação e possível reaproveitamento é um desafio ainda a ser vencido pelas sociedades modernas.

Segundo Carlos Minc (MMA, 2009),

lixo é matéria prima fora do lugar. A forma com que uma sociedade trata do seu lixo, dos seus velhos, dos meninos de rua e dos doentes mentais atesta o seu grau de civilização. O tratamento do lixo domestico, alem de ser uma questão com implicações tecnológicas é antes de tudo uma questão cultural.

O lixo tornou-se um incômodo cotidiano e isso deve-se a toda uma evolução ocorrida através dos tempos. Na Antiguidade, os resíduos eram facilmente assimilados pelo meio ambiente devido à sua composição ser basicamente orgânica. Após a Revolução Industrial surgiram as primeiras aglomerações urbanas densamente povoadas e o crescimento das cidades acelerou e, conseqüentemente, a produção de lixo cresceu significativamente.

No entanto as cidades e as pessoas começaram a depositar o lixo em qualquer lugar “fora de suas vistas”, dando origem aos lixões. Um outro fator de muita relevância em relação ao lixo urbano, é o seu destino final: hoje, na maiorias das cidades brasileiras, o destino final dos resíduos sólidos acaba sendo feito de forma errada, em que, segundo o IBGE (2009), estes são os principais destinos dos rejeitos domésticos, urbanos e comerciais do Brasil:

  • Lixão: 80%;
  • Aterros controlados: 13%;
  • Aterros sanitários: 5%;
  • Usina de reciclagem: 1%;
  • Usina de compostagem: 0,9%;
  • Usina de incineração: 0,1%.

O resultado entre a desproporção e a disposição correta do lixo faz com que grande parte dele não seja coletado. Há hoje no País diversos programas relacionados à gestão do lixo urbano, mas sobre este assunto Grippi (2006) ressalta que

é uma vergonha constatar que milhões de reais estão em risco, enquanto estes programas estivem na verdade, financiando políticos e afilhados. Nossa estatística revela que 80% do lixo gerado em nossas cidades é despejado em lixões a céu aberto. Com isto, impactos ao solo, a água e o ao ar se avolumam, assim com os impactos a saúde publica, já que vetores não são mais os únicos agentes de transmissão de doenças ao homem; o próprio homem agora convive também neste ambiente de lixão, manuseando diretamente as sobras de nossa vida gananciosa e a falta de regras ambientais sustentáveis.

E continua afirmando que

nos últimos 30 anos, o Brasil mudou seu tipo de lixo. O crescimento acelerado das cidades e ao mesmo tempo as mudanças de consumo das pessoas, trouxeram fatores que vem gerando um lixo muito diferente daquele que as cidades brasileiras produziam há 50 anos atrás. O lixo atual é diferente em quantidade e qualidade, em volume e em composição (GRIPPI, 2006).

Hoje com certeza um dos principais problemas em relação ao lixo urbano é o seu destino final. Esse é um problema que as prefeituras municipais brasileiras enfrentam no seu dia a dia, já que gerenciar o lixo urbano é um programa que pode ser muito caro. Ao contrário do que muitos pensam, o lixo é um problema de responsabilidade não só dos poderes públicos, mas também comunitário e individual, visto que cada um é responsável por jogar seu lixo em lugar adequado e assim não fazendo, geram problemas para a toda a população.

O que é resíduo sólido pode ser definido em função de sua utilidade, da disposição final e da relação da mesma com a saúde. A maioria das pessoas parte das primícias de que lixo é tudo aquilo que não serve mais para ser utilizado e o que não pode ser reciclado. Nem tudo que é velho é lixo. Mais há de se concordar, no entanto, que o lixo é o espelho da sociedade, sempre tão mais geradora de resíduos quanto mais rica e consumista. Qualquer tentativa de reduzir a quantidade de lixo ou alterar sua composição pressupõe mudanças no comportamento social.

A PROTEÇÃO À BIODIVERSIDADE E AS ÁREAS PROTEGIDAS NO BRASIL

Kátia Cilene Vieira Pontes
Licenciada em Geografia pela UEMA\CESI
Neide Rodrigues Santana
Licenciada em Geografia e Especialista em Ciências Ambientais pela UEMA\CESI
Prof. MSc. Luiz Jorge Dias
Geógrafo - Mestre em Sustentabilidade de Ecossistemas

O Brasil é um dos países mais ricos do mundo em megadiversidade[1], concorrendo com a Indonésia pelo título de nação biologicamente mais rica da Terra (BRANDON et. al., 2005). Há quase trinta anos o Brasil vem pautando seu desenvolvimento econômico e social em bases ambientais profundamente impactantes. O custo da degradação ambiental nunca foi levado em conta nos ditos “projetos de desenvolvimento”, muito embora seus prejuízos sejam sempre socializados.

O fato de o Brasil possuir dimensões continentais gerou a falsa idéia da inesgotabilidade de seus recursos naturais renováveis (GOBBI, 1995 apud PINHEIRO, 1995). Ademais, a maior parte da biodiversidade brasileira está situada em sua parcela inter-tropical, mais precisamente nas Florestas Amazônicas e Atlânticas e nos Cerrados.

Salvaguardar a biodiversidade significa tomar medidas para a proteção de gens, espécies, habitats, ecossistemas e domínios de natureza (biomais). A melhor maneira de conservar espécies é manter a qualidade dos seus nichos ecológicos. O Brasil concentra 1/3 das florestas tropicais do mundo, mas apenas 1,99% é protegido por UC’s, estando muito atrás de outros paises da América do Sul, e longe da media mundial de proteção ambiental que é de 6% (WWF, 2000).

O desmatamento em terras brasileiras e a destruição da vida silvestre acontece desde a época do descobrimento, em que ciclos econômicos diversos proporcionaram a devastação dos espaços herdados da natureza, com a crescente conversão de elementos ambientais em mercadorias, que, aos poucos, causaram redução da cobertura vegetal dos diversos domínios de natureza do Brasil, bem como diminuição de sua biodiversidade.

Embora as ameaças à vida silvestre e às paisagens naturais do País tenham sido drásticas e muitas delas irreversíveis, a história da conservação brasileira revela que já havia grande preocupação com as Florestas Atlânticas ainda no final do Período Colonial, em que Dom João VI determinou o fim do corte de árvores próximas aos mananciais e riachos que abasteciam a capital do Brasil (então o Rio de Janeiro) com água potável (IBDF, 1982 apud BARRETO-FILHO, 2009).

A partir da década de 1920 uma nova idéia de conservação vislumbra o horizonte brasileiro. Com a criação do Serviço Florestal Brasileiro, as primeiras áreas protegidas do Brasil. Na mesma década é legalizada a categoria Parque Nacional (PARNA) em um dispositivo legal (DEAN, 1996 apud BARRETO-FILHO, 2009). Na década seguinte, a de 1930, juntamente com a promulgação da nova Constituição Federal, foram promulgados os primeiros códigos “Florestal”, de Águas e de Minas e de caça e pesca. Entretanto, somente três categorias básicas de Reservas foram reconhecidas: Parques Nacional, Floresta Nacional, Estadual e Municipal.

O primeiro parque nacional devidamente institucionalizado surgiu em 1937 e o precursor desta fase foi o Parque Nacional do Itatiaia, na divisa entre os estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais, e logo após sua criação mais dois parques foram criados, sendo o da Serra dos Órgãos e do Iguaçu. Esses primeiros parques eram administrados pelo Serviço Florestal do Ministério da Agricultura e protegiam paisagens consideradas “extraordinárias” (BRASIL, 2000).

Entre os anos de 1940 a 1958 houve uma paralisação na criação de novas áreas protegidas. Somente em 1959 foram criados mais 3 parques nacionais destinados a proteger belezas cênicas, sendo eles os Parques Nacionais do Araguaia, de Ubajara e dos Aparados da Serra. Na década seguinte, em 1961, marcado pela recente fundação de Brasília, houve uma nova fase de criação de áreas protegidas, agora voltadas para o Domínio dos Cerrados, como os Parques de Brasília, das Emas e da Chapada dos Veadeiros.

De 1962 a 1970 o que de importante foi criado para a conservação brasileira foi o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal IBDF (decreto – Lei nª 289 de 1967) que ficou responsável pela administração das unidades já criadas como também a de criar novos parques nacionais, reservas biológicas, florestas nacionais e os parques de caças (BRASIL, 2000).

Em setembro de 1965 foi instituído o novo Código Florestal Brasileiro (Lei Federal N°. 4.771/1965), alterado pela Lei Federal N°. 7.803/89, que enfatiza no seu art. 1° que as florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do país, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações (BRASIL, 1989).

Entre 1970 a 1974, destaca-se a criação da primeira Reserva Biológica que foi o Poço das Antas, sendo o ultimo remanescente do habitat do Mico Leão Dourado, espécie ameaçada de extinção. Em 1974 destacou-se a criação do Parque Nacional da Amazônia, ao longo do Rio Tapajós (BRANDOS, 2005).

Segundo a Lei Federal Nº. 6.938/1981, no seu artigo 1º, há o estabelecimento da Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação. Constitui, ainda, o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) e institui o Cadastro de Defesa Ambiental. Já no artigo seguinte, o 2º, da referida Lei Federal tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana (BRASIL, 1989).

A década de 1980 representa um marco na historia da criação de Unidades de Conservação no Brasil, somando 33 unidades em todo território, sendo seis Parques Nacionais, nove Reservas Biológicas, duas Reservas Ecológicas e 15 Estações Ecológicas. Em 1984, estabeleceu-se o CONAMA (Conselho Nacional de Meio Ambiente) que veio iniciar procedimentos adequados para regular as atividades econômicas e de gestão ambiental.

Nessa mesma década foi criado o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, em 1989, incorporando em sua estrutura os dois órgãos ambientais que gerenciavam as UC’s federais: o Instituto Brasileiro do Desenvolvimento Florestal – IBDF e a Secretaria Especial do Meio Ambiente – SEMA (BRASIL, 2000).

De 1994 a 1999, 05 (cinco) UC’s foram criadas na Amazônia, tendo como destaque a Reserva Biológica de Uatumã, para compensar a extensa área a ser alagada pela barragem de Balbina, no Amazonas. Entre a década de 1990 e início dos anos 2000 novas leis surgiram para implementar as já existentes, a exemplo da Lei de Crimes Ambientais (Lei Federal Nº. 9.605/1998). No ano de 2000 é promulgada a Lei Federal Nº. 9.985/2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidade de Conservação da Natureza – SNUC, que estabelece critérios e normas para a criação, implementação e gestão das unidades de conservação que será aprofundado no tópico seguinte.

Na atualidade, entre os anos de 2000 e 2002, foram criadas 10 (Dez) unidades de conservação, sendo 04 (quatro) parques nacionais e 06 (seis) estações ecológicas. Em todas as regiões brasileiras há áreas destinadas a conservação ambiental, contemplando toda a biodiversidade do país.


[1] Megadiversidade corresponde a uma imensa riqueza de biodiversidade, ou seja, bio: vida, diversidade: variedade, em suma variedade de vida, em outras palavras podemos referir como variedade de espécies de animais e plantas existentes em um determinado lugar.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

AMAZÔNIA: EVOLUÇÃO INTEGRADA DE UMA MACRORREGIÃO

Prof. MSc. Luiz Jorge Dias
Geógrafo - Mestre em Sustentabilidade de Ecossistemas
No Pleistoceno Terminal (entre 120.000 e 12.000 A.P.), a Amazônia era apenas uma ampla extensão de savanas e a floresta estava distribuída em alguns lugares mais úmidos, em especial nas margens dos rios, bem como em áreas serranas. Nessa época, a região amazônica era habitada por grandes animais que compunham a denominada megafauna, como os mastodontes, os tigre-de-dentes-sabre, os megatériuns (ou preguiças gigantes), dentre outros cujos fósseis foram encontrados em barrancos dos rios amazônicos.
Ecologicamente, uma explicação bem sucinta para a expressiva biodiversidade da Amazônia é explicada através da Teoria dos Redutos e Refúgios, que explicam que no Pleistoceno Terminal, as matas teriam ficado reduzidas a pequenas reservas, as quais se convencionaram denominar de redutos. Isso teria ocorrido em períodos glaciais. Durante a glaciação, o clima ficava mais seco e frio, enquanto algumas áreas com maior umidade seriam ideais para os redutos de matas (AB’SÁBER, 2003; 2004; 2006b).
Nesse sentido, a ocupação humana da Amazônia ocorreu praticamente com a expansão holocênica da floresta (últimos 10.000 anos), o que implica afirmar que os primeiros grupos humanos a habitarem a floresta eram provenientes da Ásia e eram povos nômades formados por populações de caçadores e coletores, os quais obtinham do meio tudo que era necessário para sua sobrevivência sem agredir a natureza.
As mudanças climáticas ocorridas naquele período foram um dos fatores essenciais que contribuíram para o aumento da temperatura média global e macro-regional e, com isso, as florestas foram se expandindo, tendo em vista que o calor estava associado ao aumento da umidade, que se materializou processualmente na forma de chuvas intensas e constantes no pré-espaço total amazônico.
Juntamente com as mudanças dos climas globais holocênicos, dá-se início a uma nova fase de povoamento da Amazônia: os novos grupos passaram a contar com novos recursos alimentares mais diversificados, daí originando novas organizações sociais, as quais podem ser chamadas de “Cultura da Floresta Tropical”. Foi através desse conjunto cultural que a ocupação da Amazônia se diversificou. Daí consorcia-se com a vasta biodiversidade originada pela coalescência, junção, dos vários fragmentos (redutos) florestais num único contínuo fitogeográfico: as Florestas Amazônicas, que, ao mesmo passo que dotou os humanos nela já contidos de novos recursos para a subsistência, permitiu com que o processo de colonização europeu fosse literalmente obstruído ao longo dos séculos XVI a XIX. Em outros termos, originou-se aí um relativo “vazio demográfico”.
A Amazônia, por seus pujantes desafios, atraiu alguns aventureiros europeus, que em busca de riquezas minerais (em especial o ouro), os quais iniciaram pequenos núcleos de habitação ao longo de rios. Eles eram motivados pelas lendas do Eldorado e do lago Parrima, que supostamente estariam ligados a uma utópica “fonte da juventude”.
Foi com esta visão de riqueza que incitou os europeus para a expansão territorial pelos Domínios Amazônicos. Durante muito tempo, as duas potências da época, Espanha e Portugal, obedeciam à divisão territorial estabelecida pelo Tratado de Tordesilhas, o qual designava que a maior parte do que hoje se conhece como Amazônia Legal pertencia aos espanhóis. Entretanto, mesmo com seus direitos garantidos, os espanhóis não se preocuparam em povoar a Amazônia e a mesma começou a sofrer ameaça de invasão por outras expedições tais como as inglesas, as francesas e as holandesas.
O processo de formação territorial da Amazônia e da sua ocupação, na visão de Becker (2007, p. 23), dá-se da seguinte forma:
Formação Territorial (1616 – 1930):
  • Apropriação do Território (1616-1777);
  • Delineamento da Amazônia (1850-1899);
  • Definição do Limites (1899-1930).
Planejamento Regional (1930-1985):
  • Início do Planejamento (1930-1966);
  • Produção do Espaço Estatal (1966-1985);
A Incógnita do Heartland (1985 aos dias atuais):
  • A fronteira socioambiental (1985-1996);
  • Tendências Atuais (desde 1996)
De acordo ainda com Becker (2007), a Região Amazônica teve como base econômica primordial a exportação das “drogas do sertão”, permitindo a delimitação dos limites territoriais da Amazônia Brasileira entre as décadas de 1870 e 1910, mais teve a formação territorial concretizada com a definição e efetivação dos limites da Região entre 1899 e 1930.
A região Amazônia teve um processo lento e gradativo em sua ocupação, assim, vale ressaltar que diante de fatos históricos pesquisados é notório que a ocupação do espaço Amazônico ocorreu por fases, as quais, segundo Picoli (2006), ocorreram durante este processo de ocupação. E a Amazônia “ofereceu” seus produtos naturais para satisfazer as necessidades dos “desbravadores”, que apresentavam como principal objetivo satisfazer o mercado externo (BECKER, 1988).
Por conseguinte, por um longo período (até início do século XX) a Região Amazônica foi considerada um “vazio demográfico” a ser preenchido, o qual necessitava de gente para habitar. Entretanto, quando se falava em “vazio” não se mencionava as centenas de milhares de amazônidas (povos nativos da região, como indígenas e ribeirinhos), que nunca foram considerados como população pioneira, apenas eram taxados de “povo da Floresta”.
Essa falácia, para Gonçalves (2005), era considerada ideologicamente pelo desejo de manutenção da visão ainda colonialista de que a Amazônia deveria ser conquistada como se fosse um território desprovido de gente. Para muitos, ela era desprovida de povos que detivessem conhecimentos estratégicos de subsistência e de práticas sociais, formando culturas muito complexas e antropologicamente fortes e marcantes.
Esse mesmo autor diz que qualquer um dos pesquisadores sabe o quanto suas teses que foram desenvolvidas dependeram e muitas vezes dependem do saber das populações indígenas, é estes saberes que deve ser considerado um dos primeiro recursos que a Amazônia dispõe. Infelizmente, só a partir da década de 1970 que os amazônidas passaram a ser respeitados (mesmo que em parte) por outros segmentos sociais, como os acadêmicos das áreas de Antropologia, Psicologia Social, Ecologia, Etnobotânica, dentre outras.
A Amazônia foi descoberta pela Espanha, conquistada pelos Portugueses mais antes desta conquista oficial, muitos outros também fizeram suas tentativas de conquista tais como; holandeses, franceses, ingleses e europeus, onde os europeus tiveram uma presença bem expressiva na Região Amazônica, que de acordo com Becker (1988), a Amazônia Legal Brasileira vem sendo, ao longo das últimas décadas (mas com raízes colonialistas no século XVI), cobiçada internacionalmente, em especial pelas suas riquezas naturais e potencialidades econômicas. Desta forma,
o mundo volta-se para Região Amazônica, sendo esta terra cobiçada desde o século XVI com objetivo de usufruir dos seus recursos naturais, os europeus foram os primeiros a entrar em contato com o antigo e legitimo povo da floresta (PICOLI, 2006, p. 21).
A Amazônia sempre foi e é palco de interesses e disputa pelos seus recursos naturais, primeiro veio o surto das “drogas do sertão”. Dentre os ciclos econômicos vivenciados na Região Amazônica, o da borracha presumivelmente foi um dos que atraiu maior contingente populacional, com mais de 300 mil nordestinos (PICOLI, 2006), principalmente do sertão do Ceará, migraram para a Amazônia com promessas de riquezas. Assim,
nessa dinâmica do capitalismo de expansão, o Brasil, por possuir a maior reserva mundial através do Extrativismo. Há notícias de que os povos originários tinham amplo conhecimento das propriedades da borracha já em 1720. Os índios da Amazônia já conheciam a elasticidade da borracha (...). Através do aprendizado com os povos da floresta [assim, era a forma que se chamavam os nativos], a Amazônia Brasileira projetou-se ao mercado mundial de forma mais acentuada a partir do ciclo da borracha. Esse produto amazônico, monoextrativista, teve aumentada sua produção a partir de 1870, estendendo-se (...) até 1912. No mais acentuado período extrativista, a selva Amazônica foi invadida por legiões de nordestinos, flagelados da seca (PICOLI, 2006, p. 26-27).
No que concerne à devastação da floresta, percebe-se que esse processo já teve seus reflexos em séculos passados, em especial no Estado do Maranhão, onde as extensões florestais devastadas foram dando origem a Matas e Cocais, com babaçuais extensivos, e capoeiras em estágios diferentes de sucessão ecológica.
À medida que o homem foi descobrindo novas formas alimentares, o espaço a ser utilizado para as plantações ou mesmo para a criação de animais aumentava e grandes áreas de florestas nativas iam sendo derrubadas e substituídas pelas pastagens e/ou lavouras, em grande e pequena escala espacial, respectivamente. Dessa forma, a pecuária foi responsável por cerca de 80% de toda área desmatada na Amazônia Legal Brasileira (PICOLI, 2006).
Enquanto os incentivos fiscais à pecuária diminuíram nos últimos anos, adaptações tecnológicas e gerenciais a condições geoecológicas em áreas como a fronteira “consolidada” da Amazônia Oriental têm permitido um aumento da produtividade e a redução de custos. Os principais agentes do desmatamento para a implantação de pastagens são grandes e médios pecuaristas. Entretanto, existe um elevado número de agentes intermediários, geralmente com baixos custos de oportunidade, que antecipam estes pecuaristas, e que são responsáveis de forma direta por grande parte dos desmatamentos. A expansão da pecuária na Amazônia tem se beneficiado da disponibilidade de terras baratas e, em diversos casos, pela falta de cumprimento da legislação ambiental e trabalhista (BECKER, 2007; FRANKLIN, 2008; DIAS, 2006).
Com a idéia de que a Região Amazônica era um imenso “espaço vazio”, é dado a grupos de empresários o apoio de abertura de suas empresas, com o fim de atrair pessoas para ocupar a região e com isso promover o desenvolvimento econômico. Segundo Picoli (2006 p. 36), por meio da estratégia elaborada por interesses além-pátria, o Estado brasileiro passou a beneficiar os grandes projetos econômicos.
Os grandes projetos instalados na Região Amazônica tinham como objetivo primordial a acumulação do capital, entretanto, para gerar este excedente foi necessário atrair pessoas para trabalhar nas empresas, o que também foi uma forma de povoar a Região Amazônica. Os grupos econômicos detinham todo poder de manipulação dos recursos naturais que Gonçalves (2006) afirma que com todo poder que detinham, as empresas faziam à retirada das árvores, com ou sem plano de manejo, sem qualquer tipo de planejamento adequando e as áreas devastadas não eram reaproveitada de forma que visassem à conservação ambiental. Dessa forma,
as indústrias de transformação de madeira entram primeiro para depois se formar a agropecuária na região, já que as madeireiras objetivam apenas a retirada dos recursos florestais e fazem o aproveitamento econômico das arvores. O processo de retirada das árvores obedece apenas a lógica da produção: abastecer as industrias de transformação de madeiras com a finalidade de fornecer matéria prima com fins econômicos e abastecer os mercados interno e externo. (PICOLI, 2006, p. 141)
Tal processo presente nessa citação não é diferente do que aconteceu nas últimas quatro décadas na Amazônia Legal Maranhense. Ademais, os incentivos fiscais dados às empresas objetivavam os lucros gerados pelas mesmas viessem a contribuir com o crescimento econômico da região. Porém, esses ganhos não eram investidos em prol da região e, sim, em beneficio dos próprios donos e acionistas de empresas. Assim,
através da política de colonização e da necessidade capitalista em colocar a Amazônia no mercado mundial, o Estado cria mecanismos de estímulo à acumulação privada, através dos incentivos fiscais que se efetivou a transferência dos grupos econômicos para a região, pois este era o diferencial para facilitar a acumulação (PICOLI, 2006, p. 36-37).
Para controlar o capital da Região Amazônica, o Governo criou órgãos que serviam como base para incentivar a ocupação, em que as funções específicas eram: ampliar as redes de transportes e comunicação, ordenar o povoamento, incentivar a agricultura e pecuária dentre outras (BECKER, 2007). Vale ressaltar que todos estes incentivos fiscais que foram concedidos à Amazônia Legal Brasileira não beneficiou os pequenos agricultores, apenas os grandes detentores do poder econômico.
Para Becker (2007), isso significa que, enquanto espaço geográfico, territorial, a valorização estratégica da Amazônia originaria novos significados de um duplo patrimônio: o de terras propriamente ditas e o de um imenso capital natural “passível” de usufruto. É visando esse capital natural que a região, ao longo dos tempos, vem sofrendo pressão e alteração na sua configuração natural. Grandes pecuaristas são instalados em espaços desflorestados para desenvolver seus empreendimentos, os quais deixam os solos suscetíveis a qualquer tipo de agentes intempérico-erosivos, gerando ravinamentos, voçorocas e assoreamento dos cursos d’água.
REFERÊNCIAS
AB’SÁBER, Aziz Nacib. Os domínios de natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003. 159 p.
_______. Amazônia: do discurso à práxis. 2.ed. São Paulo: EDUSP, 2004.
_______. Bases conceptuais e papel do conhecimento na previsão de impactos. In: MÜLLER-PLANTENBERG, Clarita; AB’SÁBER, Aziz Nacib (orgs.). Previsão de impactos: o estudo de impacto ambiental no Leste, Oeste e Sul. Experiências no Brasil, Rússia e Alemanha. 2. ed. São Paulo: EDUSP, 2006a. p. 27-49.
BECKER, Bertha K. Amazônia. Rio de Janeiro: Ática, 1988.
_______. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. 2.ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2007.
DIAS, Luiz Jorge Bezerra. Proposta metodológica de zoneamento ambiental aplicada ao município de Anajatuba (MA). 2006. 133 f. Dissertação (Mestrado em Sustentabilidade de Ecossistemas). Universidade Federal do Maranhão, São Luís, 2006.
FRANKLIN, Adalberto. Apontamentos e fontes para a história econômica de Imperatriz. Imperatriz: Ética, 2008.
GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Amazônia, Amazônias. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2006.
PICOLI, Fiorelo. O capital e a devastação da Amazônia. São Paulo: Expressão Popular, 2006.

NOTAS SOBRE ORDENAMENTO TERRITORIAL E LEGISLAÇÃO

Prof. MSc. Luiz Jorge Dias
Geóg. Maria Veridina Barbosa de Sousa

A iniciativa de se elaborar uma Política Nacional de Ordenamento Territorial (PNOT) decorre do preceito estabelecido na Constituição Federal de 1988, que prevê em seu Artigo 21, inciso IX: “Compete à União elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social”.

A legislação brasileira que tem impacto sobre o ordenamento territorial também apresenta os mesmos vícios do planejamento nacional, no que respeita à incompatibilidade e à superposição de normas. Há que se registrar também as lacunas existentes nessa legislação, onde setores muito bem atendidos, como o ambiental, contrastam com aqueles atendidos de forma precária, como o industrial, de habitação, de infra-estrutura urbana e de viação e transportes.

Os instrumentos legais brasileiros que têm impacto sobre o ordenamento do território, referidos a seguir, representam apenas alguns itens escolhidos entre os mais significativos. Não são mencionados, por exemplo, os textos legais relativos às áreas ambiental e agrária, tendo em vista a grande quantidade de material que existe no País. A compatibilização desses textos legais é, por sinal, um trabalho importante a ser realizado pelos três níveis de governo, com o objetivo de sanar os conflitos e superposições.

A natureza do impacto sobre o ordenamento territorial, proíbe ou limita o loteamento e a construção em:

a) terrenos alagadiços e sujeitos a inundação, antes de tomadas as providências para assegurar o escoamento das águas;

b) terrenos que tenham sido aterrados com material nocivo à saúde pública, sem que sejam previamente saneados;

c) terrenos com declividade igual ou superior a 30%, salvo se atendidas exigência específicas das autoridades competentes;

d) terrenos onde as condições geológicas não aconselham a edificação;

e) área de preservação ecológica ou naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até a sua correção.

Lei nº. 10.257, de 10 de julho de 2001, que estabelece diretrizes gerais da Política Urbana (Estatuto da Cidade) estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental. A lei trata, entre outras questões relacionadas ao ordenamento do território em nível municipal, dos critérios de elaboração dos Planos Diretores previstos na Constituição Federal.

No art. 4º, capítulo II, do projeto está definido os instrumentos da política urbana, entre os quais se destacam:

- planos nacionais, regionais e estaduais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social;

- planejamento das regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões;

- planejamento municipal, onde se encontram incluídos o Plano Diretor, a disciplina do parcelamento, do uso e da ocupação do solo e o zoneamento ambiental.

- planos diretores, zoneamento ambiental, plano plurianual, diretrizes orçamentárias e orçamento anual, planos, programas e projetos setoriais, planos de desenvolvimento econômico e social.

A respeito de que estabelece a Lei de Política Urbana sobre o ordenamento do território municipal, é importante lembrar a dificuldade que pode representar para a administração municipal a elaboração de um plano de ordenamento sem poder contar com diretrizes em nível estadual e federal. Isso porque, a rigor, para existir de fato, o ordenamento do território deve ser elaborado “de cima para baixo”, ou seja, primeiro no nível nacional, depois no estadual e, finalmente, no nível municipal.

Essa hierarquização é crucial, sobretudo para as “cidades” com menos de vinte mil habitantes, que, de acordo com a Constituição Federal, não estão obrigadas a elaborar Plano Diretor. Se, pelo menos, o País, as regiões e os Estados pudessem contar com planos próprios de ordenamento territorial, um mínimo de regulamentação poderia ser instituído para esses municípios menores, no que respeita à ocupação humana, às atividades econômicas de um modo geral e, em especial, à agricultura e a exploração e uso dos recursos naturais.

Além disso, é importante lembrar que o fato de determinado Município ter uma população pequena não significa que ali não possa ocorrer o uso predatório do território municipal. A existência de um plano de ordenamento territorial nos níveis Federal e Estadual representaria, assim, uma forma de disciplinar o uso do território, mesmo em municípios que, de acordo com a legislação em vigor, não estão obrigados a ter um Plano Diretor.

O parágrafo primeiro do artigo 182 da Constituição Federal estabelece que o Plano Diretor, entendido como “instrumento básico da política de desenvolvimento e ocupação urbana” é obrigatório apenas para cidades com mais de vinte mil habitantes. Já o parágrafo segundo do art. 40 do Estatuto da Cidade determina que o Plano Diretor precisa englobar “o território do município como um todo”.

Com essa determinação, quis o Estatuto sanar a indefinição do texto constitucional, que utiliza um termo impreciso para referir-se ao município, gerando uma certa confusão a respeito de que parte do município é abrangida pelo plano diretor.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, a palavra “cidade” refere-se apenas à sede do município. Já a palavra “vila”, refere-se às sedes dos distritos que formam o município. Cada município só pode ter, assim, uma cidade, mas pode ter várias vilas. Para efeitos censitários, portanto, a população urbana de um município é composta pela soma da população da cidade e das vilas existentes nesse município. O restante é tido como população rural.

Assim sendo, de acordo com a Constituição Federal, estaria obrigado a elaborar Plano Diretor apenas o município cuja sede, ou seja, a cidade tenha mais de vinte mil habitantes. Mas, na prática, o que se tem considerado para efeito da obrigatoriedade de elaboração de Plano Diretor é a população do município como um todo.

Como se ver, o conteúdo constitucional do Plano Diretor tem um caráter eminentemente urbanístico, o que seria ponto pacifico se a sua obrigatoriedade da elaboração fosse limitada apenas aos municípios metropolitanos. No entanto, a maioria absoluta dos municípios obrigados a elaborarem seu Plano Diretor, possui características muito mais rurais do que urbana.